São muitos os especialistas que situam a redação de Geração dos Animais, um tratado sobre zoologia escrito por Aristóteles, entre os anos 330 e 322 a. C., embora muitos elementos possam ser provavelmente mais antigos.
Posterior às Partes dos Animais, Geração dos Animais vem retomar os elementos recolhidos na História dos Animais para agora explicá-los. Quais são as diferenças entre os géneros? Quais são as funções de cada um na reprodução? Quais são os seus mecanismos?
Aristóteles analisa, de forma muito metódica, cada espécie para dar respostas a estas e muitas outras perguntas. O filósofo grego, e um dos fundadores da filosofia ocidental, procurou aqui esclarecer alguns dos grandes enigmas da vida. Para além da clarividência científica, por vezes posta em causa, o leitor vai admirar a massa do saber aristotélico e o engenho das explicações que o autor oferece.
Geração dos Animais foi escrito em grego antigo e é composto por cinco livros. O Livro I apresenta as características gerais da reprodução animal (os genitais, a origem do esperma, o papel de cada um dos sexos na reprodução…). Os Livros II e III examinam os modos de reprodução específicos de cada uma das classes do reino animal (vivíparos, ovíparos, não sanguíneos…). O Livro IV estuda a diferenciação dos sexos e as semelhanças entre progenitores e descendentes. O último, o Livro V, aborda as caraterísticas variáveis entre os sexos (o sono, a cor dos olhos, a acuidade visual, o pelo, a voz…).
Portanto, nas plantas não há separação entre fêmea e macho, e nos animais em que há separação, a fêmea precisa do macho. Poder-se-á perguntar porque assim é. Pois se a fêmea possui a mesma alma e o resíduo da fêmea é a matéria, porque é que ela precisa do macho e não gera por si mesma e de si mesma? A razão está em que o animal difere da planta pela sensação. É impossível que exista um rosto, uma mão, carne ou qualquer outra parte que não possua alma sensitiva, quer em ato quer em potência, numa certa perspetiva ou em termos absolutos. Pois nesse caso seria um cadáver ou parte de um cadáver. Logo se o macho é o agente que proporciona essa alma sensitiva, onde exista separação entre fêmea e macho, é impossível que a fêmea por si mesma e de si mesma possa conceber. Pois a faculdade aqui referida é própria do macho. Mas que a questão colocada tem lógica torna-se evidente das aves que põem ovos goros, porque nesse caso até certo ponto a fêmea é capaz de gerar. Mas há aqui ainda um outro problema: em que sentido se poderá afirmar que estes ovos têm vida? Não certamente no mesmo sentido em que os ovos férteis a têm (porque destes últimos pode provir uma criatura viva em ato), nem tão pouco do mesmo modo que a madeira ou a pedra. De facto, estes ovos deterioram-se, como se à partida, de certo modo, participassem da vida. É portanto evidente que possuem, em potência, algo de alma. Mas alma de que tipo? Do último, forçosamente, e essa é a alma nutritiva, que existe por igual em todos os animais e plantas. Então porque é que essa alma nutritiva não produz a configuração das partes e do animal? Porque para isso tem de haver uma alma sensitiva, dado que as partes dos animais não são como as das plantas; logo é necessária a participação do macho (existindo ele em separado nestes seres). Porque pode acontecer o seguinte: que os ovos goros se tornem férteis, se dentro de um certo período o macho cobrir a fêmea. Mas as causas deste fenómeno serão tratadas em maior detalhe mais à frente.
Aristóteles in Geração dos Animais (pp. 136 e 137)
Geração dos Animais faz parte do projeto «Obras Completas de Aristóteles», inserido na coleção «Biblioteca de Autores Clássicos» da Imprensa Nacional. A presente tradução, a cargo de Maria de Fátima Sousa e Silva teve por base a edição de Peck, A. L. (1942; reimpr. 2000), publicada pela Harvard University Press na coleção «Loeb». A edição conta ainda com Introdução e Notas (as notas acompanham a leitura) de Maria de Fátima Sousa e Silva e Jorge Paiva. A revisão científica é de Jorge Paiva e a coordenação de António Pedro Mesquita.
«Obras Completas de Aristóteles» pretende tornar acessível ao leitor português a totalidade da coleção aristotélica. Este é um projeto promovido e coordenado pelo Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa em colaboração com o Centro de Estudos Clássicos da Universidade de Lisboa, o Instituto David Lopes de Estudos Árabes e Islâmicos, o Instituto de Filosofia da Linguagem da Universidade Nova de Lisboa e os Centros de Linguagem, Interpretação e Filosofia e de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra e com o apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
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