Não Viajarei por Nenhuma Espanha é um livro póstumo de poemas de Marcus Vinicius Quiroga, contemplado com o Prémio Imprensa Nacional/Ferreira de Castro na sua primeira edição, em 2019. Juntamente com Uma Casa no Mundo, de Irene Marques, Não Viajarei por Nenhuma Espanha vem inaugurar, a «Coleção Comunidades Portuguesas», uma coleção que pretende trazer a público testemunhos, documentos, ensaios e obras de criação literária respeitantes aos portugueses que vivem, trabalham e criam fora de Portugal, numa iniciativa conjunta do Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Está agora publicado e disponível nas livrarias.
Não Viajarei por Nenhuma Espanha é, nas palavras do júri do Prémio Imprensa Nacional/Ferreira de Castro, «um conjunto de poemas congraçados por manifesta unidade temática e estilística, plasmando, desse modo, o que se reconhece como a apreciável maturidade poética do autor. Junta-se a isto a fina sensibilidade do poeta que, fazendo dialogar a poesia com outras artes, constrói um macrotexto com notável riqueza cultural, expresso com rigor formal e cultivando metros com tradição consolidada», que assim fundamentou a escolha desta obra na 1.ª edição do prémio.
in Contracapa
Marcus Vinicius Quiroga (1954-2020), brasileiro com origens portuguesas, foi contista, crítico, ensaísta e, principalmente, poeta. Professor, formado em Letras, com mestrado em Comunicação e doutoramento em Literatura Brasileira e em Comunicação, colaborou em ensaios e resenhas no Jornal do Brasil, nas revistas da Academia Brasileira de Letras e da União Brasileira de Escritores. Membro da Academia Carioca de Letras e do PEN Club, publicou vinte e seis livros de poesia, obtendo com eles inúmeros prémios de grande importância e reconhecimento no cenário literário brasileiro.
NADA
Não dê atenção a comentários.
Aqui não se passa nada, nada.
Este é o solar da senhora Alba.
Tudo sob as rédeas e as palmas
que dão ordens a suas criadas.
A santa paz da família salva
as mulheres das tensões da carne.
Não leia jornais, nem ouça rádio.
Aqui não se passa nada, nada.
Esta é uma casa só de saias.
Todas fazem as tarefas ágeis;
cosem, bordam, limpam, lavam, passam.
A casa se encontra sempre às claras,
apesar da sombra que há nas faces.
Não fale a estranhos, não se afaste.
Aqui há limites, muros, grades.
Este é o solar de donas castas.
Não se ouve palavra feia ou má
em seus raros e curtos diálogos.
No mundo só há boatos. Saiba.
Aqui não se passa nada, nada.
p. 64
Por fim, de recordar que o Prémio Imprensa Nacional/Ferreira de Castro, além de homenagear a figura incontornável e exemplar de Ferreira de Castro, pretende reforçar os vínculos de pertença à língua e cultura portuguesas, bem como estimular a participação de portugueses residentes no estrangeiro e lusodescendentes, prestando, assim, às comunidades portuguesas dispersas pelo mundo o justo reconhecimento pelas atividades que desenvolvem nos seus países de acolhimento. Criado pela Imprensa Nacional em parceria com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Prémio Imprensa Nacional/Ferreira de Castro dá continuidade à missão da editora pública de promoção e preservação do património da língua e da cultura portuguesas. O galardão tem uma periodicidade anual e distingue trabalhos inéditos nas áreas de Ficção e Poesia.