São 219 títulos. Vamos escrever por extenso, que é para se perceber melhor: são duzentos e dezanove títulos. É este o número que nos enche as medidas: duzentos e dezanove títulos editados na coleção «Ciência Aberta» da Gradiva.
Quando eu era miúdo, Famalicão ficava bem mais longe do mundo do que agora fica o Kiribati. Era perto do Porto, sim, mas só se contarmos a distância em quilómetros. Porque obrigava a fazer a Estrada Nacional 14, a passar a Trofa, a passar a Maia, a passar uma entrada na cidade que se fazia por curvas e contracurvas que nunca entendi verdadeiramente (mas de que, paradoxalmente, tenho agora saudades). Por isso, em Famalicão só havia uma «livraria», onde a D. Natércia nos mostrava os livros à distância, atrás do balcão — querida e saudosa D. Natércia. O único local onde ler, para além das visitas trimestrais do Sr. Granja do Círculo de Leitores? A biblioteca municipal.
Foi lá que comecei a ler Carl Sagan, Stephen Jay Gould, H. Reeves, Yves Coppens, François Jacob, Stephen Hawking e até, valha-me Deus, Steven Weinberg num livro chamado Os Três Primeiros Minutos — este último, que me ensinou como é bom aprender para, depois, compreender (embora, confesso, nem com a frequência no curso de Astronomia ou a licenciatura em Biologia já o tenha compreendido). Qual o denominador comum de todos estes livros? A Gradiva, o trabalho de Guilherme Valente, de Luís Alves e, soube anos depois, de Maria do Rosário Pedreira.
Só consigo imaginar quantos Jorges foram inundados pela cultura científica por causa desta coleção. Quantos miúdos perdidos numa Famalicão do país souberam que fazia sentido queimar formigas num tubo de ensaio porque havia quem escrevia sobre o facto de as galinhas poderem ter dentes. Quantos jovens cientistas aprenderam a curiosidade nos livros que a Gradiva editou.
O Jorginho, como me chamavam quando pequeno, só pode pedir ao Jorge Reis-Sá para agradecer. «Agradeça, por favor, sim?» Bem mandado, agradeço. Por que sei que o Reis‑Sá só é cientista — mesmo que escritor ou editor, mas nunca se deixa de ver o mundo em formato Excel — porque a Gradiva ofereceu ao Jorginho livros e livros e livros. Duzentos e dezanove, contam-se até hoje.
Obrigado à melhor editora de ciência em Portugal. Obrigado Guilherme Valente, Luís Alves, Maria do Rosário Pedreira e, a partir do número 201, Carlos Fiolhais (a quem se deveria agradecer mais ainda, pelo serviço que tem feito à ciência portuguesa em várias formas e feitios). Obrigado por me explicarem o «cosmos», como o panda tem polegares esquisitos, como a flatland é maravilhosa e como um pouco mais de azul faz sempre falta, principalmente quando se decompõe o arco-íris. Mesmo que vá morrer sem perceber bem o que aconteceu nos «três primeiros minutos». Mas, convenhamos, compreender tudo vai contra o que mais se pede à ciência: a curiosidade.
Um Universo Vindo do Nada de Lawrence M. Krauss, com tradução a partir do original inglês de Florbela Marques, revisão científica de Carlos Fiolhais e prefácio de Richard Dawkins.
Publicado em março de 2017 pela Gradiva, depois de impresso nas oficinas gráficas da Multitipo.