Título: Diário 2000-2015
Coleção: Biblioteca de Autores Portugueses
Autor: João Bigotte Chorão
Apresentação: Marcello Duarte Mathias
Edição: Imprensa Nacional
Data: quinta-feira, 26 de abril
Horário: 18 horas
Local: Biblioteca da Imprensa Nacional
Rua da Escola Politécnica, n.º 135
Lisboa
Entrada livre limitada à capacidade da sala.
João Bigotte Chorão nasceu na Guarda, estudou em Coimbra, vive em Lisboa, é membro efetivo da Academia das Ciências, e é uma figura incontornável das letras portuguesas.
Foi diretor do departamento de Enciclopédias da Editorial Verbo. Conviveu de perto com nomes tão relevantes como Torga, Mourão-Ferreira, Tomaz de Figueiredo e Natércia Freire, e destacou-se em grande medida pelos seus textos de crítica e de recensão, e pela sua participação enquanto editor e redator nalgumas importantes revistas literárias do século XX.
Iniciou a escrita diarística em 1958, tendo já publicado na Imprensa Nacional em 2001 o seu Diário Quase Completo, a que vem agora juntar este segundo volume de reflexões que continuou a registar até 2015.
Marcello Duarte Mathias — diplomata de carreira, e ele próprio diarista por quem João Bigotte Chorão nutre manifesta consideração pessoal e literária — será o apresentador desta recente edição.
Uma evidente cumplicidade entre dois pensadores do nosso tempo.
23 de maio [de 2010]
Aproveito toda uma semana para ler ao ar livre o novo volume do Diário de Marcello Duarte Mathias, leitura que só interrompo para namorar o jardim, agora bem cuidado, com a olaia majestosa, e para admirar a sinfonia verde da serra da Lousã. Lamento não poder gozar mais tempo e mais vezes a casa e a paisagem, sobretudo quando, como agora, não há chuva, nem vento, nem frio.
Se há leitores que apreciarão mais neste Diário o que lá se diz da vida diplomática – da carreira e da casa, para usar a terminologia ali usual –, outros, como eu, interessam‑se antes pelas reflexões sobre literatura autobiográfica, tão familiar ao autor. Surpresa de ver citados os diaristas brasileiros Lúcio Cardoso e Ascendino Leite, que poucos aqui conhecem. Para Lúcio Cardoso, não são os acontecimentos que fazem um diário, mas a ausência deles. Em Marcello Duarte Mathias há, pelo contrário, muitos acontecimentos, alguns deles de relevância discutível. A rebelião de Abril fornece, naturalmente, matéria para comentários críticos, que não poupam aqueles que não sabiam o que faziam – ou por demais o sabiam. Alguns, julgando‑se protagonistas, pisaram desajeitadamente o palco da História, como simples comparsas. Quem anteriormente detinha o Poder deixou‑o fugir das mãos, enleado em perplexidades e indecisões, fatais para o País, abandonado à destruição apressada e irresponsável.
Não faltam neste Diário retratos, não raro polémicos e devastadores, de políticos e militares, de diplomatas e escritores. A república literária é toda uma lamentável feira de vaidades, ambições, invejas. O incenso vai sempre para os mesmos autores, e não sobra nada para os que a crítica ignora sistematicamente.
Em Portugal, escrever é para muitos uma atividade clandestina, no juízo certeiro de Marcello Duarte Mathias. Que anuncia um livro de aforismo, desafio arriscado para quem conhece Cioran.
Em suma: um Diário que convida à leitura, aberto tanto à literatura como à pintura. De salientar ainda o culto de uma família de raízes beirãs – raízes que são uma defesa contra as tentações cosmopolitas. Ao contrário do estrangeirado que só lá fora se sente bem, Marcello Duarte Mathias não esconde as saudades da terra e o sabor de cada regresso.