Título: Jorge Gonçalves, 20 Anos de Trabalho
— Fotografias, Artistas Unidos
Autor: Artistas Unidos
Apresentação: Maria João Luís e Jorge Silva Melo
Edição: Imprensa Nacional
Data: segunda-feira, 26 de março
Horário: 18h30
Local: Biblioteca da Imprensa Nacional
Rua da Escola Politécnica, n.º 135
Lisboa
Foi, faz agora vinte anos. Nem sei se foi alguém que mo recomendou, se foi por eu já ter visto as suas belíssimas fotografias de Vera Mantero ou de João Fiadeiro, não sei. Sei que, uma tarde nos finais de junho de 1998, o Jorge Gonçalves nos apareceu, nos Recreios da Amadora, num ensaio quase final de Aos que Nascerem Depois de Nós, um espetáculo que dirigi com canções de Bertolt Brecht. E fotografou, fotografou, fotografou. Ainda a fotografia era em película, ainda usava o preto e branco, fazíamos uma volta da peça para as fotos a cores, outra para o preto e branco.
E foram deslumbrantes aquelas primeiras fotografias, é ver as pp. 24, 99 e 132, deslumbrantes. Movimento, composição, relação entre atores, rostos em ação, olhos — é aquele o teatro de que gosto e, logo nessa longa primeira sessão, o Jorge Gonçalves se entendeu bem com esta nossa (barroca?) desarrumação que não deixo de dedicar ao que tanto aprendi com o Tintoretto. Sim, o Jorge Gonçalves gosta do desequilíbrio, da instável relação de forças, do corpo vivo dos atores, dos olhos que irradiam, do corpo em queda, do olhar furtivo, da mão que se eleva até à boca.
E desde então tem andado connosco. Sempre. Passou da película ao digital, acabou-se o preto e branco e as longas noites a revelar em casa, acabou-se esse mundo, falamos em RAW e em DPI, mas ele continua a fotografar, e são vibrantes os trabalhos que nos trás, esplendorosos. Foram vinte anos, são milhares de fotografias, quase duzentos atores, tantas peças, muitos diretores, tantas salas diferentes, grandes umas, sem recuo outras tantas, pequenas muitas delas, A Capital, o Taborda, as Mónicas, a Malaposta, o Dona Maria, o CCB, a Culturgest, a Mundet no Seixal, a Voz do Operário, o Belém-Clube, o São Luiz, o Teatro Municipal de Almada, o Centro Cultural do Cartaxo, o Estrela 60 de tantos ensaios, agora o Teatro da Politécnica (mudámos mais vezes de casa do que de sapatos?), tanta sessão, tanta fotografia, tanto nome, tanto trabalho, tanto talento: vinte anos.
O teatro vive mal com os registos, desconfio dos vídeos, veneno omnipresente que torna tudo velho, mais velho do que a memória.
E o que o Jorge Gonçalves faz não é de todo um registo, ele não é testemunha, inventa fotografia a partir dos ensaios, fotografia da vida que está dentro dos espetáculos, é uma outra maneira de olhar o mundo, é reescrita, é fotografia, chamemos-lhe arte, que foi para isto que se inventou esta palavra.
Muitas vezes tem de se acrescentar luz ao desenho que o Pedro Domingos fez, e tentamos seguir-lhe as linhas mestras, quase nunca temos recuo para fotografar os sempre extraordinários cenários da Rita Lopes Alves, preso que o Jorge anda (e deve andar) à movimentação dos atores, à sua instantânea vulnerabilidade. Vemos só uma parte, sim, «a parte pelo todo», como se diz que é a metonímia.
E não é isso mesmo a fotografia? Ou seja, a poesia?
Para nós é isso: vinte anos.
Maria João Luís
Estreou-se no teatro em 1985 no grupo de teatro A Barraca (Um Dia na Capital do Império, Um Homem é Um Homem, Fernão, Mentes?, O Diabinho da Mão Furada e O Baile, sempre com encenação de Helder Costa). Trabalhou ainda no Grupo de Teatro da Casa da Comédia, Acarte, Teatro da Malaposta, Teatro da Comuna. No Teatro da Cornucópia participou em A Comédia de Rubena de Gil Vicente (enc. de Luís Miguel Cintra), Antes Que a Noite Venha, de Eduarda Dionísio (enc. de Adriano Luz), Tito Andrónico, de Shakespeare, e Um Homem é um Homem, de Bertolt Brecht (enc. de Luís Miguel Cintra). Interpretou várias peças na televisão com direção de Ferrão Katzenstein, Artur Ramos, Cecília Neto e Luís Filipe Costa. Presença regular em séries e novelas da televisão, trabalhou no cinema com Fernando Matos Silva, Teresa Villaverde, João Botelho e Luís Filipe Rocha.
Jorge Silva Melo
Estudou na London Film School. Fundou e dirigiu, com Luís Miguel Cintra, o Teatro da Cornucópia (1973/1979). Bolseiro da Fundação Gulbenkian, estagiou em Berlim junto de Peter Stein e em Milão junto de Giorgio Strehler. É autor do libreto de Le Château dês Carpathes (baseado em Júlio Verne) de Philippe Hersant; das peças Seis Rapazes Três Raparigas, António, Um Rapaz de Lisboa, O Fim ou Tende Misericórdia de Nós, Prometeu, Num País onde não Querem Defender os meus Direitos, Eu não Quero Viver, baseado em Kleist; de Não Sei (em colaboração com Miguel Borges ) e O Navio dos Negros. Fundou em 1995 a sociedade Artistas Unidos, de que é director artístico. Realizou as longas-metragens Passagem ou A Meio Caminho, Ninguém Duas Vezes, Agosto, Coitado do Jorge, António, Um Rapaz de Lisboa; a curta-metragem A Felicidade; o os documentários António Palolo e Joaquim Bravo, Évora, 1985, etc, etc, Felicidades, Conversa com Glicínia, Conversas em Leça em Casa de Álvaro Lapa, Nikias Skapinakis – O Teatro dos Outros, Álvaro lapa: A Literatura, António Sena, A Incessante Mão, Ângelo de Sousa: tudo o que sou capaz e A Gravura: Esta Mútua Aprendizagem. Traduziu obras de Carlo Goldoni, Luigi Pirandello, Oscar Wilde, Bertolt Brecht, Georg Büchner, H. P. Lovecraft, Michelangelo Antonioni, Pier Paolo Pasolini, Heiner Müller e Harold Pinter.