É preciso falar do trabalho do Francisco José Viegas à frente da Quetzal. Porque os anos passam e até parece que foi há dias. Não foi. Foi há 10 anos – e não é «depois do adeus» que se canta «dez anos é muito tempo»? Ou, neste caso, depois de se ter chegado?
A Quetzal não começou com ele. Nem o Viegas começou com a Quetzal. Uma nasceu em 1987, nas mãos sapientes de Maria da Piedade Ferreira e Rogério Petinga, entre outros. Outro nasceu também por essa altura para os livros, quando a LER se tornou sua casa. Com a saída da Maria da Piedade para criar a Gótica e, depois, a Oceanos, a Quetzal passou uns anos de intervalo à procura do rumo que Viegas lhe veio dar e que a Piedade já lhe dera. Francisco José Viegas, entretanto, criara uma Babilónia de pouco mais que um livro dentro da LeYa (mas um importante livro, o primeiro romance do Francisco Camacho), antes de lá sair como autor para a Porto Editora e, as voltas que o Mundo dá, como editor para esta lindíssima ave de que aqui se quer celebrar os últimos anos.
São 10 anos de literatura. E outras coisas, claro – mas de literatura. E trazendo autores e autores para o convívio de literatos, fazendo-os também próximos de quem não se considera tão literato. Os nomes são infindáveis, pelo que me coibirei de os repetir. Bolaño, Borges, só dizendo dois maiúsculos com maiúscula em B. E, claro, os autores portugueses que tem trabalhado, sempre com um cuidado que já lhe conhecia na LER.
Porque – declaração de interesses para os distraídos – o Francisco foi por mim editado nas Quasi, foi meu editor na LER, recebeu-me no «Escrita em Dia», em suma, é um amigo. Não devemos elogiar os amigos? Balelas: são esses os que devemos elogiar, nunca por serem amigos mas porque merecem.
Mas queria, e quero, falar do Vergílio Ferreira. Já dele dei nota noutra «Edição Nacional» da agenda da Imprensa Nacional. Mas quero falar dele novamente porque foi outro dos recuperados pela nova Quetzal. Repescado à Bertrand, do mesmo grupo e onde editara nas últimas décadas os seus livros – décadas, mesmo, julgo que pelo menos desde Signo Sinal, de 1979 –, viu-se reeditado com a certeza de um clássico ter de estar disponível. Não o tenho todo na Quetzal – tenho-o muito nas edições antigas, algumas delas primeiras. Um deles, o Alegria Breve, o único livro de que tenho três edições e nunca li até ao fim. Tenho comigo a primeira, assinada para o Urbano Tavares Rodrigues, que consegui salvar de um alfarrábio; tenho uma dos Amigos do Livro, que era do meu pai; tenho a da Quetzal, roxa e límpida. E é esta que estas férias vou reler. Ou ler. Fico sempre – sempre – no final do primeiro capítulo, porque o releio incontáveis vezes. A forma como ele enterra a mulher é de um lirismo e dureza sem explicação. Deixo-me estar, sempre. E volto ao livro no dia seguinte e começo outra vez. E deixo-me estar. E volto. E estou. E volto. Não faz mal: quero espaçar as leituras de todos os livros do Vergílio Ferreira pela minha vida inteira.
Pouso os olhos na areia – estou de férias. Ouço na televisão «o futuro está aí», é noite. E lembro o Francisco José Viegas naquela caixa, onde o conheci primeiro, como todos. Celebro aqui a sua carreira mais curta de editor. Mas espero que um dia volte à televisão para nos trazer novamente os livros. E que não se preocupe – pode falar dos da Quetzal, que o que interessa é serem bons, não serem por si editados. Bem editados.
Alegria Breve de Vergílio Ferreira,
com primeira edição na Quetzal
em Lisboa, em 2015.
Design da RPVP Designer e execução
gráfica no Bloco Gráfico da Porto Editora.