Granta é uma revista literária com publicação simultânea em Portugal e no Brasil. É dirigida por Pedro Mexia e por Gustavo Pacheco. A «traição» é o tema que serve de mote a esta nova Granta em Língua Portuguesa. Um tema multidisciplinar, transversal, global, e que acompanha a humanidade desde tempos imemoriais.
A propósito do crime de “lesa‑majestade”, ou seja, de traição ao rei, dizem as Ordenações Manuelinas (1521) “que é a pior cousa, e mais abominável crime que no homem pode haver, a qual os antigos sabedores tanto aborreceram, e estranharam, que a compararam à gafém [lepra], porque esta enfermidade enche todo o corpo sem se nunca poder curar […]; o erro da traição não somente condena o que o comete, mas ainda empece e infama todos os que de sua linhagem descendem, posto que culpa não tenham”. Quinhentos anos depois, ainda consideramos a traição “abominável”, embora nem todas as traições, e certamente não a traição por contaminação genealógica. Este número da Granta investiga diferentes traições, em diferentes domínios, com diferentes motivos. Serão essas traições todas iguais, ou haverá traições menos iguais que outras, traições compreensíveis, virtuosas até?
Pedro Mexia, in Granta
No dia 2 de agosto de 1914, Franz Kafka anotou em seu diário: “Hoje a Alemanha declarou guerra à Rússia. De tarde fui nadar.” No dia 12 de maio de 2020, anoto em meu diário: “Hoje morreram 881 pessoas no Brasil por causa do coronavírus. De tarde fui escrever a apresentação para a Granta.” Jamais teríamos acesso ao diário de Kafka, assim como a muitas de suas obras, se seu amigo Max Brod não tivesse ignorado o pedido de queimar todos os seus manuscritos após a sua morte. Viva a traição! Onde estaríamos sem ela?
Gustavo Pacheco, in Granta
Colaboram neste volume: Diana Athill, Edyr Augusto, Wolf Biermann, José Pedro Cortes,
Kalaf Epalanga, Adam Foulds, Regina Guimarães, Noemi Jaffe, John le Carré, Helder Macedo, David Means, Paulo José Miranda, Carlos Eduardo Pereira, Paulo Portas, Alexandre Vidal Porto e Larissa Zaidan.