Depois de A Religião no Espaço Público Português, de Helena Vilaça e Maria João Oliveira, A Teologia Ficcional de José Saramago, de Marcio Cappelli, e Livro, Texto e Autoridade, de Rita Mendonça Leite, a coleção «Estudos de Religião» acaba de receber o seu quarto título: Génese e Institucionalização de Uma Experiência Eremítica. Da «Pobre Vida» à Congregação da Serra de Ossa (1366-1510), de João Luís Inglês Fontes.
Génese e Institucionalização de Uma Experiência Eremítica. Da «Pobre Vida» à Congregação da Serra de Ossa (1366-1510) pretende iluminar um dos movimentos religiosos mais interessantes da Idade Média, bem sinalizador dos dinamismos, tensões e expectativas que marcam a vida religiosa deste período.
A busca da solidão e do retiro do mundo começou cedo no cristianismo. Muitas vezes, o despoletar do eremitismo revelou-se também como uma forma de contestação. Por estar aberta tanto a leigos como a clérigos, tanto a homens como a mulheres, mas por denunciar, também, o que constituía uma vida cristã instalada, demasiado comprometida com o mundo, com a riqueza e com o poder. O movimento eremítico que aqui se estuda, que se desenvolveu no Sul de Portugal e que daria origem à Congregação dos Eremitas de São Paulo da Serra de Ossa, atesta a vitalidade e capacidade de atração da vida solitária sobre os homens dos finais da Idade Média. Mas é sobretudo revelador dos dinamismos e dos paradoxos de uma opção de vida religiosa que procura os caminhos do ermo e do silêncio para salvaguardar a sua identidade, perante os poderes leigos ou eclesiásticos que a pretendem controlar e normalizar. Com um percurso pela história deste movimento eremítico, desde os seus primeiros tempos até à época da sua institucionalização, este livro oferece um encontro com os nomes e os rostos dos homens que procuraram nesta vida solitária e pobre, de contemplação, penitência e trabalho, uma resposta para os seus anseios de viver mais perfeitamente o Evangelho de Cristo.
In Contracapa
Este livro conta com preâmbulo do professor José Mattoso e prefácio de D. Manuel Clemente e retoma a tese de doutoramento em História Medieval que João Luís Inglês Fontes defendeu em novembro de 2012 na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Para esta edição reviram-se alguns aspetos pontuais que beneficiaram da crítica dos arguentes da dissertação ou do contributo mais recente de estudos sobre as mulheres da «pobre vida».
A obra de João Luís Inglês Fontes, que agora felizmente sai a público, presta-nos um relevante serviço, tanto do ponto de vista historiográfico como do cultural, dando ao primeiro a informação mais certa e ao segundo a qualidade mais densa. Do ponto de vista historiográfico, foi geral a recolha feita das fontes arquivísticas disponíveis e da literatura respeitante sobre o tema. Tema, aliás, pouco tratado, no pormenor ou no conjunto. A vida eremítica é intencionalmente discreta e pouco dá a conhecer de si mesma. É-lhe própria a «fuga do mundo» e a pouca ou nenhuma presença nos cenários que dão notícia. Por isso mesmo mais releva o presente trabalho, por ter seguido todos os indícios, valorizado a mais pequena informação e conjugado a recolha numa sistematização sólida e esclarecedora. Do ponto de vista cultural, ou seja, do sentido das coisas, a densidade advém-lhe da própria temática que aborda, inteiramente existencial. Os eremitas portugueses, agora recuperados, assinalaram naquele tempo, tão final (do medievo) como inaugural (da modernidade), o que de mais dramático pode ter a existência humana quando sonda o seu próprio porquê. Aqueles homens não viviam por viver, somando dias aos dias. Exercitavam em si mesmos o essencial que buscavam.
José Manuel Clemente in «Prefácio»
A coleção «Estudos de Religião» é coordenada pelo Centro de Investigação em Teologia e Estudos de Religião da Universidade Católica Portuguesa e acolhe estudos e ensaios multidisciplinares sobre as religiões e as dimensões religiosas da cultura. É uma coleção que, além de estar aberta à interpretação de textos religiosos e teológicos, visa compreender melhor as mundividências, identidades e dinâmicas sociais no campo religioso, promover o estudo das práticas, das mediações e da memória religiosa das sociedades, bem como analisar as teorias da religião.
Sobre o autor
João Luís Fontes nasceu em 1971 em Maceira, Torres Vedras. Doutor em História Medieval (2012) pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde é atualmente professor auxiliar em História Medieval. É investigador integrado do Instituto de Estudos Medievais, do qual é atualmente subdiretor, e do Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica Portuguesa. Tem desenvolvido uma ampla investigação em torno da história religiosa tardomedieval, com uma particular atenção ao universo laical e dos novos movimentos de renovação religiosa, incluindo as suas expressões mais marginais, mas não menos significativas, associadas tanto à procura da vida eremítica ou da reclusão voluntária como aos beatérios femininos que florescem em contexto urbano.