Ficha
«Ainda o ‘Inquérito à Edição em Portugal’: alvo de fogos cruzados, a Imprensa Nacional/Casa da Moeda vem à estacada, pela pena de um seu administrador, dizer o que faz neste campo — e porquê».
«Não tenho tempo para responder especificamente a cada um dos editores que se pronunciaram sobre a atividade editorial da INCM. Parece-me mais importante o trabalho de conclusão do programa de edições deste ano e de elaboração do de 1982, em que ando completamente absorvido. Ainda assim, procurarei arrumar as principais questões de que me lembro em cinco grandes grupos seguidos de uma pequena ironia. Eis o que tenho a dizer:
I. A questão do estatuto
1. A Imprensa Nacional conta 213 anos de tradição editorial, com as responsabilidades culturais correspondentes. Não esteve portanto à espera do signatário para se transformar numa editora.
2. É uma empresa pública (e não um serviço do Estado). Como tal, goza de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, financeira e patrimonial. Não depende do OGE.
3. Tem de nortear-se por princípios e critérios de gestão que se encontram legalmente definidos.
4. Não pode editar ‘a fundo perdido’. O anterior estatuto, que lhe permitia fazê-lo em determinadas circunstâncias excecionais, foi entretanto revogado.
5. Só é possível editar obras cuja comercialização se preveja deficitária, se se editarem outras que permitam cobrir tais prejuízos, equilibrando o conjunto. É uma regra elementar para qualquer editora e para qualquer programa.
6. Adiante-se que a atividade editorial da INCM envolve meios financeiros muito escassos (inferiores a 1% do seu ‘chiffre d’affaires’ anual) e que o pessoal afetado a esta área corresponde apenas a cerca de 0,33% do total dos trabalhadores da empresa.
II. A questão dos subsídios
7. Nem a lei (DL n.º 260/76, de 8 de abril, art.os 20.º e 21.º, n.º 2, a) nem o estatuto do IPL, nem o da INCM impedem que esta seja subsidiada.
8. O Ministério da Cultura, a SEC e o IPL não são, que se saiba, uma espécie de fundo do desemprego (o que compete por certo a outras áreas governamentais); atuam em termos de políticas culturais de fundo, apreciando e apoiando propostas e programas segundo o respetivo mérito cultural.
9. Supõe-se ter sido a INCM a única editora que atempadamente apresentou à SEC e ao IPL um programa editorial para 1981, global, coerente e articulado, prevendo possibilidades várias de desenvolvimento alternativo e exclusivamente dedicado à cultura portuguesa. […]
III. A questão dos programas
10. Nenhum programa editorial consequente pode estabelecer-se por uma espécie de ‘via residual’: não é possível agir a reboque pela determinação pontual e sucessivamente alterável das obras a não editar ou a editar, consoante outros editores pretendam ou não fazer negócio com elas.
11. A INCM vem assegurando supletivamente aquilo em que uma parte dos editores não se mostra excessivamente empenhada: um vasto programa elaborado na contemplação exclusiva da cultura portuguesa, do seus valores, dos seus temas essenciais, das suas figuras, dos seus autores.
[…]
14. Na prossecução dessa política, vem-se adotando fórmulas flexíveis de cooperação e de coedição com as mais variadas entidades dos setores público e privado, entre elas outras editoras, instituições, associações, cooperativas, autarquias, etc., o que tudo é legal, sensato e desejável.
15. Só através de uma conjugação de esforços e meios deste tipo se afigura possível ultrapassar certos impasses na edição regular, minimamente programada e diversificada do património literário e cultural português do passado e do presente.
[…]
17. Anote-se de passagem que a presente atividade editorial da INCM só é viável pelo recurso à indústria privada de tipografia, com os consequentes benefícios para o setor.
IV. A questão da televisão
18. O programa de televisão ‘Autores Portugueses’ foi proposto à RTP partindo da ideia simples de que duas empresas públicas de grande relevância cultural podem associar-se num projeto também eminentemente cultural, voltado para o grande público e respeitando aos títulos da Biblioteca de Autores Portugueses, o que se justificava pela natureza do empreendimento.
19. Certamente que, nessa época, a RTP teria estado recetiva a uma ideia semelhante, se alguém mais a tivesse para lha apresentar.
[…]
V. A questão da concorrência
23. É óbvio que a INCM concorre com as outras editoras pela razão singela de que edita livros e pretende vendê-los.
24. No aspeto quantitativo essa concorrência é pouco significativa: a empresa não dispõe de meios nem de estruturas para publicar mais de uns cinquenta títulos por ano […].
VI. A questão final
29. Dir-se-ia que um trabalho deste género mereceria um respeito mínimo em qualquer país civilizado. O que antecede não é um enunciado poético de princípios e boas intenções. […]»