Atraso de desenvolvimento da classe gráfica portuguesa.

  • Referência
    SILVA, Manoel Roque da, «Questões Técnicas», O graphico: orgão official da União das Artes Gráphicas, n.º 14, de 15 de agosto de 1907, pp. 2‑3.
Assunto

Críticas ao atraso de desenvolvimento da classe gráfica portuguesa e da fundição de tipos da Imprensa Nacional.

Ficha

«[…] Entre tantas questões tratadas ultimamente pela classe gráfica, não veio ainda a lume a da competência profissional, e no entanto a cada passo esbarramos com ela, pondo-nos sérios obstáculos na realização das nossas aspirações. Quem tenha percorrido a maior parte das oficinas tipográficas verá, triste é dizê-lo, a forma por que se executam os diversos trabalhos de que a indústria gráfica se compõe: trabalha-se sem ordem, sem regras, sem método, perfeitamente ao acaso, resultando de tudo isto um caos verdadeiramente horroroso que, confesso, me contrista bastante.
[…] Responder-me-ão os colegas que todo este descalabro é devido à falta de escolas profissionais, de onde o nosso aprendizado saísse já com noções gerais, teóricas e práticas, da arte que se propunha exercer. É realmente verdade. Mas enquanto essas escolas se não formam, procuremos nós por outras formas, ao nosso alcance, difundir a instrução profissional, tanto quanto caibam em nossas acanhadas forças.
[…] Ninguém ignora, porém, o progresso que se tem feito de há 20 anos a esta parte em todas as fundições — exceto na Imprensa Nacional, onde creio vigorarem ainda os mesmos processos. Os magníficos specimens estrangeiros que ora começam a ser manuseados com mais frequência por nós, dizem-nos bem claro que devemos pôr de parte todas as velharias que até aqui nos têm preocupado, a ponto de nas colunas deste jornal eu estar vendo que um colega, aliás inteligentíssimo, estar dia a dia criticando com bastante proeminência a Imprensa Nacional no seu organismo atrasado e ronceiro e na sua secção de Tecnologia, parece quase defendê-la, tal é a meticulosidade com que nos apresenta regras e princípios ali seguidos e que nós já de há muito devíamos ter abandonado por imperfeitos e anti-artísticos.
Desculpe-me o colega e não veja nesta minha forma de expor qualquer censura, pois que de sobejo sei eu que a sua intenção é boa, é mesmo perfeitamente a minha, com a diferença de que o colega é um produto do meio antiquado, isto é, cheio de peias, enquanto que eu me encontro nisto desde uma época mais recente.
Realmente, estarmos a perder tempo a escrever para a classe dizendo-lhe que um frontispício deve ter a forma ovalada, que se não devem empregar duas caixas baixas seguidas, que as assinaturas devem ser feitas em versaletes, e outras exposições iguais, quando essa mesma classe vê nos soberbos catálogos estrangeiros perfeitamente o contrário, é inútil! […]»