Não é de agora o meu elogio à coleção «Retratos da Fundação», da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Mas agora é-me mais fácil fazê-lo publicamente sem que o tresleiam: já lá publiquei um livro, pelo que se segundas intenções parecessem existir, elas ficam sem razão para parecerem.
O que tem feito o António Araújo pela edição de autores portugueses ainda será bem mais valorizado do que neste pequeno parágrafo — é que é mesmo muito.
Mas vem este pequeno intróito a pretexto de um livro dos livros, da autoria de Carlos Maria Bobone. Já o lia no Observador, amiúde. Mas só quando me caíram os olhos na badana de A Religião dos Livros a primeira surpresa aconteceu: tem 29 anos e é alfarrabista.
Não sabia de uma coisa nem de outra. Os seus textos no jornal são demasiado adultos e sapientes para tão tenra idade (a idade, quando adjetivada antes do nome é sempre tenra ou provecta, já repararam?). E a profissão não me surgiu no radar porque há anos que resolvi trocar o vício dos sebos pelos selos — forma, tão-só, de separar as horas de trabalho das de lazer. Mas, sobre isso, ainda virá um dia maior reflexão.
Comecei um livro numa viagem moderna de avião, onde uma velhota irlandesa, sentada ao meu lado, lia um ebook num tablet. Tudo palavras em estrangeiro. Eu trouxe livros — o que me permite manter a lombalgia de há uns dias próxima o suficiente, mas, enquanto houver comprimidos na farmácia, está tudo bem. Sou um velho, graças a Deus.
Fazia por isso sentido, entre a leitura triste e alegre do magnífico A História de Roma, novo romance da Joana Bértholo, debruçar-me sobre mais este lindo objeto que a Fundação nos ofereceu. Vou a meio. Tenho rido, tenho carregado o semblante em algumas passagens, não por desacordo mas por alguma tristeza (ah, o velho…). E gostei imediatamente da primeira parte: num livro que se quer como apologia dos livros e dos livreiros, agrada-me a referência ao aumento de alfabetização, a como um livreiro pode ser mais que um calimero. Está difícil? Claro — a velhota continua a ler no seu tablet, pelo que não me parece que vá comprar livros tão cedo (daqueles que aqui se falam, os que provocam lombalgias). Mas também há futuro para quem os vir como mais que uma mercadoria e da sua venda queira fazer vida. E, convenhamos, até e talvez mais ainda para quem os veja assim.
Vou voltar à Roma da Joana para depois terminar a missa do Bobone. Quanto a si leitor, que vá deste texto em paz e que a leitura o acompanhe.