“Para o Ministro do Reino
Ill.mo e Ex.mo Snr. = A ilustrada protecção, que o Governo de S. Magestade tem dado a este Estabelecimento, principalmente desde que estou encarregado da sua Administração; o especial interesse e favor que deve a V. Ex.ª, que tanto me tem honrado com a sua confiança, autorizando-me para fazer melhoramentos e aquisições da maior importância, em manifesta vantagem do serviço; parece-me terem chegado ao ponto de justificar-se pelos seus uteis resultados. Tenho a satisfação de dizer a V. Ex.ª, que a maior parte dos arranjos necessários para dar mais extensão e facilidade aos trabalhos nas diferentes oficinas da Imprensa Nacional estão concluídas e que o resto em poucos dias deverá ficar acabado. Não tomarei o precioso tempo de V. Ex.ª descrevendo-as; porque V. Ex.ª os viu e avaliou quando se dignou ultimamente visitá-la. Não falarei também do excelente efeito que produzem as duas machinas hidraulica e o Prelo de cilindro, para cuja compra fui por V. Ex.ª autorizado; porque também por essa ocasião V. Ex.ª o observou; limitar-me-ei a assegurar a V. Ex.ª, que a Imprensa Nacional, quanto às disposições materiais acomodadas aos seus diferentes misteres se acha em estado de satisfazer às condições, de um Estabelecimento Público da sua natureza, nesta época tão assinalada, pelos progressos industriais; entretanto não é possível deixar de reconhecer que algumas coisas essenciais lhe faltam para o seu complemento. A variedade dos tipos e ornatos constitui a maior riqueza, e a primeira necessidade de uma tipografia, e nesta parte a Imprensa Nacional labora numa embaraçosa deficiencia. Além dalguns caracteres antigos, de que temos matrizes; mas que estão quase inteiramente fora de uso, possuimos apenas restos de Fundições de letras de semelhantes qualidades, mandadas vir de fora há muitos anos, e que por isso estão muito estragadas, falhas em algumas sortes e por consequência quase inuteis. Há tão grande falta de Gravadores Puncionistas no nosso país, que por agora seria grave irreflexão, esperar e querer com o seu trabalho ocorrer às variadas exigencias de uma Fundição Tipográfica no dia de hoje. Alem de um hábil artista neste ramo, que há na Imprensa Nacional, que tem feito e está fazendo alguns excelentes Punções, mas que pela sua avançada idade mal pode trabalhar com um só homem, e de um outro individuo, que me consta ocupar-se particularmente nesta espécie de gravura, não sei eu que haja quem exercite. Para conservar entre nós, dei já ao artista a quem me refiro um discipulo que está adiantado e promete poder substituí-lo; tenciono, se o Governo de S. Magestade houver por bem aprová-lo dar-lhe mais dois ou três discípulos; mas o fruto desta escola restaurada só pode colher-se depois de alguns anos. Estas considerações levaram a Administração precedente desta casa a mandar vir de França, algumas matrizes, que infelizmente não foram pela maior parte as mais bem escolhidas, por serem de caracteres floridos [?] cujo gosto caprichoso, quasi que tem passado; era o gosto do tempo, e por isto está longe da minha intenção a menor ideia de censura. Segui o exemplo; tenho também mandado vir algumas matrizes de França, e pode dizer-se que os dois ultimos jogos que vieram, fornecem o melhor tipo, que a casa tem. Continua infelizmente a necessidade de nos socorrermos à indústria estrangeira enquanto a nossa não poder suprir-nos neste ramo, e não está só a falta que experimentamos, na arte tipográfica nos diferentes objectos em relação com ela; na litografia, que tão grandes progessos tem feitos nestes ultimos anos no nosso País, e de que neste Estabelecimento, existe uma excelente oficina que tenho aumentado consideravelmente, há processos novos de grande aperfeiçoamento, que são quase desconhecidos entre nós, e que se praticam em algumas Nações mais adiantadas nas artes. Parece-me portanto que seria de uma vantagem incontestável, se o Governo de Sua Magestade encarregasse uma pessoa com conhecimentos práricos de ir por 3 ou 4 meses a Londres, a Paris, e talvez a Bruxelas, com o duplicado fim de comprar alguns objectos tipográficos mais necessários e úteis, e de ver e observar esses novos , mas aperfeiçoados prodeccos. Na situação difíciol em que nos achamos, pelo estado de apuro do nosso Tesouro, pode esta ideia suscitar porventura, à primeira vista alguma objecção; porem os meios porque julgo, que ela pode ser realizado, e as considerações gerais e economicas que a este respeito se oferecerem, devem no meu entender por em evidencia a sua utilidade. No estado actual das Sociedades, nos Governos representativos, a publicidade que só a Imprensa pode realizar, é uma das primeiras condições da sua existencia, o mais eficaz e poderoso meio de civilização, e daqui resulta, que a Imprensa, considerada não só intelectual, mas até materialmente se pode sizer que é a mais certa medida do adiantamento das Nações. Destas verdades se deduz que é absolutamente necessário promover o seu adiantamento, que num povo como nós, que apenas começamos a desenvolver as nossas faculdades industriais, esse cuidado é da parte do Governo um dever, e esse dever não exige felizmente neste caso pesados sacrifícios. Se o Governo de S. Magestade se dignasse honrar-me com esta comissão, eu a aceitaria com o maior gosto; não só porque muito desejo prestar qualquer serviço que possa ser útil ao meu País, como porque tenho o maior interesse e empenho pela prosperidade deste Estabelecimento, cuja administração me está confiada, e eu julgo que poderia desempenhar, se assim lhe aprouvesse, sendo autorizado a contrair um empréstimo de 8:000.000 réis, a pagar num ano com os seus respectivos juros, pelos lucros e fundos da mesma Imprensa. Esta soma não é certamente grande em relação aos objectos, que é necessário comprar; porque V. Ex.ª bem sabe, que um só jogo de matrizes custa de 600 a 700 mil réis; não é grande em relação aos meios de pagamento, porque a receita da Imprensa neste ano deverá aproximar-se, se não exceder a 70:000.000 réis, e os lucros devem ser proporcionados; e por que apesar das muitas despesas extraordinárias, que se tem feito posso assegurar a V. Ex.ª, que o seu crédito é superior às suas dívidas, que dentro de 3 meses estarão completamente extintos, nem é menos a quantia que no decurso de um ano ela terá de gastar na compra de diferentes objectos, que precisa, e que deveria mandar vir sucessivamente de França ou de Inglaterra, se como até agora tem acontecido, e julgo convir, eu continuasse a ser autorizado para provê-la das coisas necessárias com a diferença, que a sucessiva mas demorada aquisição delas retarda o complemento do arranjo de um Estabelecimento, em que interessa o decoro nacional e o crédito do Governo, acrescendo ainda, que encomendas de tal natureza não satisfazem muitas vezes às condições exigidas, dando por isso motivo a contestações, cujo resultado, é de ordinário em prejuízo de quem as fez, e que sobre o preço da compra trazem o encargo de grandes comissões, em beneficio dos comerciantes a quem se fizeram. Esta diferença cobriria uma parte das despesas da comissão, ficando outra no meu entender subejamente compensada pelo proveito, que da minha inspecção ocular, e observação me parece, que pode resultar para este Estabelecimento. Creio, que não haverá dificuldade em realizar o empréstimo indicado, ou com o Banco ou com qualquer associação comercial. Julgo contudo que muito o facilitaria se eu fosse primeiramente autorizado para segurar o estabelecimento; ideia de cuja conveniencia absoluta já tive a honra de falar a V. Ex.ª, e que V. Ex.ª me pareceu aprocar. Poderia segurar-se o Estabelecimento em 50.000.000 réis. Esta soma oferece uma garantia suficiente aos seus principais valores na desgraçada eventualidade de um incendio, e o seu respectivo premio é tão módico, que importa um pequeno encargo. À vista do que acabo de expôr e submeto à elevada consideração se deverã resolver o que houver por bem. Deus Guarde a V. Ex.ª Lisboa etc. 10 de Maio de 1843. Ill.mo e Ex.mo Snr. António Bernardo da Costa Cabral – O Administrador Geral = José Frederico Pereira Marecos.” (pp. 85 v. – 87 v.)