A coleção «Olhares» acaba de receber Mocidade Portuguesa, de autoria de Jorge Calado. Poderíamos escrever que se trata da autobiografia do autor, mas é o próprio que nos desvenda, no preâmbulo da obra, o que é o livro:
Não é uma biografia, nem um livro de memórias, muito menos um ensaio de pendor social, embora partilhe aspetos com todos estes géneros. A história começa numa casa em Lisboa, percorre o bairro, atravessa a cidade, espalha-se pelo país, para acabar em Oxford, no Reino Unido. Uma viagem no tempo, física e mental, ao longo de trinta anos, balizada por livros, bichos, filmes e óperas, sem respeitar as unidades aristotélicas de espaço, tempo e ação. A mente como museu de memórias cujo conteúdo é imperioso estudar, conservar e divulgar. Um fluxo de consciência onde tudo está relacionado com tudo o resto, formando um objeto redondo, sem princípio nem fim.
A história de Jorge Calado serve de mote. A haver um subtítulo talvez se pudesse chamar «Memórias de um tempo perdido».
«Ao escrever este livro quis também recriar o meu modo de raciocinar enquanto criança. Imagens e palavras são o verso e o reverso da imaginação, …»
Mocidade Portuguesa, título amplamente ilustrado, estrutura-se em três secções de seis capítulos cada. Os títulos são apenas indicativos. Embora independentes, os capítulos cruzam-se: podemos encontrar música em «Bichos» e bichos em «Passear»; no capítulo da «Música», por exemplo, discute-se o racismo e encontra-se também lugar para a visita de Isabel II de Inglaterra a Portugal, em 1957. Há cinema e literatura em quase todos os capítulos. Jorge Calado escreveu três capítulos especiais — cobrindo o seu encanto com a cor azul, a sua paixão por Shakespeare e a sua dívida intelectual e sentimental a Oxford.
No Natal de 1945 — estava eu prestes a completar oito anos — o tio António ofereceu‑me a História das Vidas Célebres Contada às Crianças, de João Amaral Júnior. Um livro de capa dura colorida e formato médio, com 190 páginas e biografias de oito benfeitores da humanidade. O patriotismo exigia que o primeiro e último fossem portugueses: o navegador da globalização Fernão de Magalhães — cuja viagem ocorreu há exatamente meio milénio — e o poeta do amor, João de Deus, autor da Cartilha Maternal (1876), que constituía um novo método de aprendizagem da leitura. Os restantes seis eram todos cientistas e/ou inventores: três americanos, um sueco (o botânico Carl Linnaeus) e um casal francês. Os inventores americanos eram Benjamin Franklin (para-raios), Thomas Edison (lâmpada de incandescência) e Alexander Bell (telefone); o casal eram os físico-químicos Marie e Pierre Curie, ela polaca, ele francês, famosos pelos estudos radioquímicos. A bomba atómica desabara no ano da publicação do livro, mas pensava-se que a radioatividade podia curar muitas doenças.
Jorge Calado nasceu em Lisboa, em 1938. Estudou no Liceu de Pedro Nunes, licenciou-se em engenharia química pelo Instituto Superior Técnico (IST) e doutorou-se em química‑física pela Universidade de Oxford. Professor catedrático de química-física e de termodinâmica química no IST, foi também professor catedrático adjunto de engenharia química na Universidade de Cornell, EUA. Jorge Calado foi galardoado com o 1.º Prémio Ferreira da Silva da Sociedade Portuguesa de Química (1982), eleito sócio efetivo da Academia de Ciências de Lisboa em 1988, e recebeu o Prémio Universidade de Lisboa (2016). Jorge Calado concebeu e dirigiu os primeiros cursos de gestão das artes no Instituto Nacional de Administração (1988-93) e fundou a IST Press em 1997. Interessado nas relações entre as ciências e as artes, colaborou com o Times Literary Supplement nos anos 1980 e continua como crítico cultural do Expresso desde 1986. Nos últimos trinta anos organizou mais de 30 exposições de fotografia em Portugal, França, Bélgica, Reino Unido e EUA. É autor de Haja Luz! — Uma História da Química Através de Tudo (3.ª edição, 2016) e Limites da Ciência (2.ª edição, 2021).
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