Detalhes de documento

  • Arquivo
    INCM/Arquivo Histórico da Imprensa Nacional
  • Cota
    402
  • Tipo de documento
    Exposição
  • De:
    Administrador Geral
  • Para:
    Ministro do Reino
Transcrição

“(…) Apenas encarregado por Sua Magestade da Administração deste Estabelecimento empreguei-me com toda a possivel assiduidade em entrar no conhecimento do seu verdadeiro estado, e convenci-me de que ele se achava a todos os respeitos em deplorável atraso e desarranjo, consequencia invevitável das vicissitudes porque temos passado desde muitos anos. Entendi de que era uma necessidade melhorá-lo e introduzir nele todos os aprefeiçoamentos que a arte tipográfica tem conseguido entre as nações civilizadas, e que depois de melhorada era reciso adoptar meios eficazes para a sua conservação. Comecei desde logo a fazer o que de mim dependia para se obter o primeiro daqueles importantes fins. O ilustrado Governo de Sua Magestade auxiliou-me com recursos extraordinários para alcançar o que eu só não podia fazer. A Imprensa Nacional tem desde a minha volta de França tudo de quanto carece para ser um Estabelecimento completo no seu género, e para satisfazer cabalmente a todas as exigencias do serviço a que pela sua criação foi destinada. Creio que são já bastantes os factos que abonam esta minha asserção, e espero que sucessivamente que outros não tardem a confirmá-la. Obtido este resultado, as minhas vistas deviam naturalmente voltar-se para os meios de conservar o que a tanto custo se tem feito. Persuadi-me de que o mais eficaz desses meios era acabar em Lisboa com quaisquer outras oficinas tipográficas directa ou indirectamente sustentadas à custa do Estado, e dar à Imprensa Nacional a incumbencia exclusiva de fazer todas as impressões pagas com fundos públicos. Parecem-me tão óbvias e absolutas as razões de conveniencia desta medida, tenho aludido tantas vezes a elas, que seria ocioso reproduzi-las, ainda quando a superior inteligencia de V. Ex.ª, que melhor do que eu decerto as conhece e avalia, não fosse o juiz da materia. Nesta convicção, e neste sentido tive a honra por vezes de falar a V. Ex.ª e em particular com referência à tipografia da Academia Real das Ciências, que no interesse da mesma Academia, e por transcendentes considerações de interesse público (e só por esses motivos) me parecia conveniente transferir para a Imprensa Nacional. Ordenou-me V. Ex.ª que fizesse sobre este objecto uma exposição por escrito, obedeci [sic.] como me cumpria, e tal é a origem do meu ofício de 23 de Janeiro ultimo. Para afastar de mim toda a ideia de que pudessem influir na minha opinião quaisquer outras causas que não fossem a convicção da sua utilidade, procurei particularmente diferentes membros da Academia, a quem expus o meu pensamento e as minhas razões, e pareceu-me ter achado em todas explicita aquiscência. Vejo que me enganeio, porque quase todos esses ilustres membros assinaram o parecer em contrário dado por uma comissão da mesma Academia que V. Ex.ª se serviu mandar ouvir ácerca do meu supracitado ofício. Desejei muito também pelo mesmo motivo entender-me com o Ex.mo Snr. Conselheiro Macedo, Secretário perpétuo da Academia; mas ão me foi possível, apesar de o ter procurado diferentes vezes, por se achar então fora de Lisboa. Farei agora algumas observações sobre o parecer da Comissão a que me refiro para cumprir a determinação de V. Ex.ª. O parecer é, como era de esperar, rico de erudição e de uma lógica verdadeiramente atlética, pela qual seria até glorioso para mim dar-me por vencido; entretanto as nuvens levantam-se algumas vezes até às grandes sumidades, e a ilustre comissão na grande altura em que se acha não viu decerto no pó a que deixou reduzidas todas as minhas razões alguns fragmentos que não ficaram impalpáveis, e esse vou eu de novo oferecer à consideração de V. Ex.ª – Se tivessemos conferenciado a esse respeito talvez que o ilustre Academico, cujo saber tanto respeito, e cujo interesse pelas sciencias reconheço, talvez que a minha proposta não fosse tão mal recebida, porque verbalmente teria eu dado esclarecimentos que melhor fariam entender as razões que elas se fundam. – Dizia eu na minha exposição, como argumento de analogia, que o Instituto de França não tinha uma imprensa sua. Como falava deste grande corpo científico em contraposição à nossa Academia, chamei-lhe também Academia. Se há excesso nesta liberdade retórica, aceito a correcção indirecta que a ilustre Comissão me faz. – Mas provou a ilustre Comissão que o Instituto tem uma imprensa sua? – Creio que não; subsiste por consequencia em toda a sua força o argumento de analogia.
Dizia eu meia, que as diferentes Repartições do Estado em França eram obrigadas a mandar fazer na Imprensa Real, as suas impressões, e que o mesmo Instituto ali mandava fazer as suas. Não contaria a ilustre comissão, nem o podia fazer, a primeira parte desta asserção; porém diz que o Instituto, assim como outros estabelecimentos científicos deixaram de fazer as suas impressões na Imprensa Real, e as mandam fazer em oficinas particulares, como lhes apraz, e apresenta como prova uma preciosa lista de edições mandadas fazer por diferentes corpos científicos em oficinas particulares.
Quem poderá contestar a verdade em evidência? Quando eu me achava em Paris, informando-me a este respeito com o Ex.mo Visconde de Santarem, a quem devi importantissimos esclarecimentos e serviços em diferentes objectos relativos à comissão de que eu estava encarregado, fez-me S. Ex.ª observar este mesmo facto, citando-me as mesmas ou semelhantes edições; mas perguntando eu depois na Imprensa Real a razão deste arbitrio nos corpos científicos, afirmaram-me que era uma excepção necessário, porque provinha da impossibilidade da Imprensa Real, apesar da sua grande extensão de meios, satisfazer a todas as publicações de tal natureza. Não se dando entre nõs esta razão, parece-me que não deve ter lugar o arbitrio que sobre ela se funda. E é tanto verdade que só porque a Imprensa Real de Paris não pode fazer todas estas publicações elas se fazem em oficinas particulares, que se não fosse este o motivo todas ali se fariam por particular interesse de quem as paga, porque ninguém trabalho melhor que a Imprensa Real, e porque os seus preços são sempre mais baixos que os do comércio.
Supondo porém triunfante nesta parte a resposta da comissão, seguir-se-á daí que a Academia não deva imprimir na Imprensa Nacional, se por outras razões se mostrar que assim convém às nossas circunstâncias?
Quanto aos tipos gregos, árabes e hebraicos, pondo de parte a história da aquisição das matrizes árabes, que projectei comprar a Mr. Biesta & Laboulaye, (história que se passou como no meu oficio expus a V. Ex.ª, e em confirmação do que junto a carta que recebi há tempo desses negociantes), direi somente que nunca haverá em Portugal uma oficina digna do tempo em que vivemos de caracteres orientais, se ela se não estabelecer na Imprensa Nacional, superentendida na parte intelectual por dois membros da Academia professores orientalistas, como acontece, e a ilustre comissão decerto o sabe, na Imprensa Real de Paris.
Para prevenir a objecção de excesso nos preços, dizia eu na minha exposição que eles seriam feitos de acordo com pessoa ou pessoas para esse fim commisionadas pela Academia. A ilustre Comissão não considera este circunstância no seu parecer, e para mestrar que os preços da Imprensa Nacional são exorbitantes, ou muito maiores dos que os da mesma Academia, esquecendo-se de que esta Repartição tem, e merece fé publica nos documentos que passa, e não pode alterar a verdade do que se acha escriturado nos seu livros, pediu a um particular um atestado do que aqui se lhe levara pela composição de uma folha de pandeta, junta esse documento e sobre ele estabelece um falso aumento de comparação, porque também é falsa. A inclustre comissão esqueceu-se de perguntar quel era o formato dessa folha dos Armais Marítimos, porque se o perguntasse saberia que e dum formato duplicado em relação áquele que a Academia emprega nas suas obras.
A ilustre comissão esqueceu-se ainda de notar a diferença que deve haver na execução de trabalhos tipográficos desde que a Imprensa se acha provida de mais extensas e aperfeiçoados meios de execução, e por isso a razão da demora que em outro tempo poderia alegar-se talvez com justiça deixa interamente de subsistir.
Nunca me persuadi que a trsnferencia da imprensa da Academia para este Estabelecimento pudesse dar-lhe um interesse correspondente aos encargos que ele ia tomar por esse facto, quando a propuz a V. Ex.ª foi unicamente com vistas do interesse geral das letras e da arte, e da economia do Tesouro. Se apesar dos fundamentos indicados na minha exposição a que de novo me reporto a Academia pode fazer melhor, mais depressa e mais barato as suas publicações, e em maior vantagem das ciências e da instrução, felicito-a cordialmente; e a V. Ex.ª compete determinar o que houver por mais conveniente para se realizarem tão importantes resultados (…) Lisboa etc. 13 de Agosto de 1844. = Ill.mo e Ex.mo Snr. António Bernardo da Costa Cabral. = A Administrador Geral – J. F. P. Marecos.” (pp. 71-78)