“(…) A manufactura das Cartas de Jogar quando a Imprensa tinha o exclusivo da sua fabricação, foi o mais importante ramo do seu rendimento; os lucros liquidos eram aproximadamente de 18 a 20 contos de réis, dos quais o Erário recebia 6 anualmente, turando avultadas somas do cofre desta Repartição sempre rico de fundos quasi que só provenientes desta origem. Uma parte considerável do consumo das Cartas para o Brasil, e muito concorria para que ele fosse tão grande serem as Cartas todas feitas de Papel colado, em consequência do que tinham muito menor duração. A separação do Brasil, e ultimamente o Emprego do Cartão para fazer as Cartas reduziu considerávelmente a sua extração. O Decreto de 10 de Outubro de 1832, que aboliu o Privilégio da Imprensa destruindo o sistema fiscal que estava estabelecido para evitar o contrabando, facilitou-o de um modo extraordinária e directo, em dano não só da Fazenda Pública, mas de todos os particulares, que depois se tem empregado nesta indústria. Ainda assim a Imprensa Nacional, continuando a fabricar Cartas, para não deixar inuteias as excelentes oficinas, e machinas e utensilios, que serviam e este trabalho, fabricava e vendia uma porção de Cartas que lhe deixava algum lucro para ocorrer às suas despesas, e ajudar as do Estado nas Impressões que se fizeram por sua ordem; porém a Carta de Lei de 7 de Abril de 1838, que estabeleceu o selo de 40 réis deu o último golpe nos interesses, que este Estabelecimento tirava da manufactura das Cartas porque não havendo meio algum eficaz de fiscalizar o selo, daí tem resultado, que o maior numero de Cartas se vendem sem selo, enquanto que a Imprensa Nacional, guardando como lhe cumpre a disposição da citada lei é obrigada, a selar todas as que vende. Este estado de coisas reclamava uma providência, e por mais de uma vez, e em diferentes ofício eu tenho chamado a atenção do Governo sobre este objecto. O mal existe, e a necessidade de lhe dar remédio é evidente. V. Ex.ª avaliando devidamente esta matéria, e estando empenhado em introduzir as possíveis melhorias no diferentes ramos de Administração do Ministério do Reino serviu-se ordenar-me que, levando à sua presença os dados estatisticos, que possam servir de base ao juizo do que mais convem fazer, indicasse ao mesmo tempo o que eu julgasse mais acertado. Com a lealdade e verdade com que devo proceder vou submeter a V. Ex. os factos, que é preciso considerar, e as minhas observações acerca deles , e V. Ex.ª com a sua ilustrada imparcialidade resolverá o que houver por melhor. Não devo dissimular que nas actuais circunstâncias, quando o contrabando deste género tem chegado a tal grau de facilidade, e quando muitos particulares se ocupam neste industria, que pode exercer-se com meios muito pequenos, e extremamente fáceis, intendo que o restabelecimento do Privilégio não daria uma compensação equivalente ao desfavor com que seria recebido. A Imprensa poderia quando muito vender 7 a 8 mil maços de Cartas, que por um preço razoável não deixariam de lucro mais de 3:200.000 réis e para se obter este resultado era indispensável estabelecer meios de fiscalização, que nunca poderiam ser tão eficientes, como os que anteriormente existiam. Durante o antigo Privilégio a Imprensa tinha um Juiz Conservador, um Escrivão privativo, e oficiais próprios para as diligências, as gratificações para estes Empregados se tiravam do produto dos emolamentos das licenças ou nomeações de Administradores e Estanqueiros, que eram solicitadas com empenho apesar de pagarem ainda à Fazenda um avultado selo, porque davam grandes Privilégios. Parte destes Privilégios, assim como o juízo privativo, são incompativeis com o estado actual da Legislação. Poderia organizar-se um novo plano de fiscalização; mas era necessário criar para isso uma nova classe privilegiada, que deixou de existir. São grandes e obvios os inconvenientes que daí resultam, e eu não me atrevo a efirmar que se conseguissem as vantagens que os compessassem. Poderia convencionar-se com os Contadores de Tabaco fazerem eles vender as Cartas pelos seus Estanqueiros, porém este meio além de depender da vontade dos Contractores, oferece outros inconvenientes. Em qualquer das duas hipótese não julgo que se pudesse conseguir proporcionados lucros, e em tais circunstâncias tenho a convicção de que é mais prudente e razoável renunciar ao restabelecimento do Privilégio. Resta-me considerar agora se por outro meio se pode evitar o prejuízo que esta Repartição sofre e a Fazenda Pública conservando-se as coisas como se acham. Segundo uma nota oficial que recebi da Junta do Crédito Público, tem produzido o selo das Cartas em todo o Reino desde Abril de 1838 até ao fim de 1842 6:800.000 réis e apenas 260 braralhos foram apreendido por contrabando; podendo calcular-se o consumo dem 8000 maços por ano deviam ter-se selado 36 000 maços no valor de 17:280.000 réis; ficou por consequência fraudada a Fazenda em 10:480.000 réis, sem falar no prejuízo indirecto que sofreu esta Repartição. A Lei do selo como existe desacompanhada dos meios de verificar a sua execução, não pode evitar nem sequer diminuir a continuação de três fraudes, e a Imprensa Nacional será obrigada ou a deixar de ocupar-se nesta manufactura, e a inutilizar assim o capital considerável que se empregou nas suas respectivas oficinas, ou a trabalhar com perda certa; por que não pode entrar em concorrencia com a desvantagem de 40% em que importa o selo de cada baralho. Julgo portanto que seria conveniente, e creio que a Junta do Crédito Público está deste acordo, acabar com o selo das Cartas, e substituir este importo por uma avança com os Fabricantes deste fénero e que dará um resultado igual ao do selo se ao mesmo tempo se empregarem diligencias para evitar contrabando externo, e dará algum favor as esta Repartição, que na qualidade de Estabelecimento público ficaria isento da avença. Talvez não fosse menos plausível o arbitrio, de deixar inteiramente livre esta pequenina indústria, ficando apenas sujeita às regras gerais da imposição industrial. À vista do exposto V. Ex.ª optará pelo que tiver por mais conveniente, e concluindo redobro as minhas instâncias para que V. Ex.ª se sirva de fazer com que a este respeito se tome uma pronta resolução; porque os interesses desta casa, que tanto ptecisa e merece a protecção do Governo estão sofrendo uma quebra altamente prejudicial. (…) Lisboa etc.ª 28 de Janeiro de 1843 = Ill.mo e Ex.mo Snr. António Bernardo da Costa Cabral. = O Administrador Geral = J.F. P. Marecos.” (pp. 76 v. – 78 v.)